segunda-feira, 27 de maio de 2013

0 Redução da maioridade penal divide opiniões

Mossoró

Por Luciana Araújo em 25/05/2013 às 13:04

Os casos de violência envolvendo pessoas com idade inferior a 18 anos e a abordagem da grande mídia sobre o assunto colocam, novamente, em evidência as discussões em torno das propostas de redução da maioridade penal. A temática que divide opiniões, embora nem sempre seja discutida em todos os seus aspectos, vai além da questão da idade em que se deve iniciar a responsabilização penal de alguém que infringe a lei. Ela passa por questões relacionadas ao investimento em políticas públicas que contribuem para evitar o ingresso dos adolescentes no mundo da violência e para ressocializá-los, quando esse ingresso ocorrer, e ainda coloca em evidência atual situação do sistema penitenciário.

Caso a medida seja colocada em prática, infratores a partir dos 16 anos seriam submetidos a regime de prisão

Para o responsável pela 10ª Promotoria de Justiça de Mossoró, promotor Olegário Gurgel, existem vários projetos para alterar a questão da maioridade penal, dentre eles, a proposta que mais se sobressai é reduzir a idade penal dos 18 para os 16 anos. “E, nesta hipótese, a gente vai ter um contingente de adolescentes que, eventualmente, praticaram ou vierem a praticar um ato infracional, que passam a ser julgados por um juízo criminal. Deixam de ser responsabilizados no âmbito do Estatuto da Criança e do Adolescente para serem responsabilizados no âmbito do Código Penal Brasileiro. Isso significa que, serão sancionados, não mais pela perspectiva da socioeducação e sim pela perspectiva da retribuição, da pena. E esses adolescentes vão se submeter a um regime de prisão que não tem uma vocação, nem uma proposta, nem uma intenção de reintegrar, de forma ampla e integral essa pessoa para a convivência social”, explica o promotor.

De acordo com Gurgel, a redução da maioridade penal só pode ser feita através de uma reforma constitucional, pois a maioridade penal não está no Estatuto da Criança e do Adolescente, que data de 1990, e sim na Constituição Federal, que é de 1988. “Para mudar isso aí eu devo mudar, na verdade, a Constituição. O Estatuto apenas regula um preceito constitucional, que e o artigo 227 e 228 da Constituição Federal”, acrescenta.

Com relação à realidade de outros países onde a idade em que o indivíduo pode responder penalmente pelos seus atos é inferior à faixa etária nacional, o promotor considera que a comparação é injusta, tendo em vista que se tratam de realidades e estruturas do sistema diferentes. Ele compara, no entanto, a realidade dos dois sistemas existentes no Brasil e considera que o sistema penal é muito mais ineficaz do que o juvenil.

“Eu acho que essa discussão, para ser legítima, ela deve se situar apenas no plano de vista político. O Brasil tem que decidir, politicamente, o que ele quer. Eu tenho minha opinião, sou contrário à redução da maioridade penal, por uma série de circunstâncias que eu acompanho no dia a dia. Eu acho que o Brasil perde muito mais do que ganha. Mesmo porque, o problema da violência não vai resolver em nada. Porém, a questão política ela está em aberto. Eu desejo, eu enquanto comunidade nacional, desejo submeter a pessoa a uma privação maior? A um sancionamento maior do que hoje eu faço? Essa é a única questão que pode legitimar”, diz Olegário Gurgel.

O delegado regional de Mossoró, Denys Carvalho da Ponte, por sua vez, afirma que o que percebe é o ingresso, cada vez mais cedo, de adolescentes no crime. Como exemplo, ele cita o caso de uma criança de 11 anos envolvida em um assalto.

Segundo ele, a maioria dos adolescentes é utilizada para o tráfico de drogas, roubo e furto, porque são sabedores da legislação especial. O delegado comenta que, quando pega uma arma em um crime com um menor de idade, ele assume por saber que não ficará preso.

Denys Carvalho da Ponte é favorável à redução na faixa etária penal. “Com respeito à redução da maioridade penal, eu sou a favor”, diz, argumentando que, se aos 16 anos o adolescente tem o direito de votar e se cogita também o direito de que possa dirigir, ele deve ser responsabilizado, já que existem menores de idade matando e roubando.

Para Olegário Gurgel, no entanto, o debate não gira apenas em torno de ter ou não consciência sobre os fatos. “Se for por aí, eu acho que o garoto de dez anos já deveria ser responsabilizado, porque ele já sabe o que é certo o que é errado, isso nasce bem mais cedo”, argumenta.

O delegado afirma que a resistência à mudança se deve ao fato de que os presídios nacionais já são superlotados, o setor passa por uma crise gigantesca. Aliás, todos enfrentam crises, mas, como comenta o delegado, no sistema prisional as dificuldades são maiores. Além disso, o sistema prisional não conta com medidas no sentido de promover a ressocialização. O objetivo do cárcere é tirar de circulação o indivíduo que comete crimes.

A responsável pela Delegacia Especializada no Atendimento ao Adolescente Infrator (DEA), Liana Aragão, ressalta a explicação de Olegário Gurgel de que, para a redução da maioridade penal acontecer seria necessária uma nova Constituição, pois, por se tratar de uma cláusula pétrea, ou seja, que não pode ser alterada.

Ela defende um ponto de vista diferente, que foge da redução ou não da maioridade penal. Para Liana Aragão, o sistema que responsabiliza o menor e o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente deveriam ser mais rigorosos e as estruturas disponibilizadas pelo Estado deveriam funcionar melhor. Para a delegada, os problemas estruturais conferem ao adolescente a sensação de impunidade.

“Eu acho que o ECA pode ser mais rigoroso”, afirma Liana Aragão.
   

Falta de estrutura adequada prejudica ressocialização dos jovens

Embora Mossoró conte com todas as estruturas indicadas pelo Sistema Nacional de Socioeducação (SINASE) para que os adolescentes em conflito com a lei cumpram as medidas socioeducativas, os problemas estruturais dificultam a realização dos trabalhos.

As políticas públicas e programas socioeducativos previstos pelo Sinase incluem, desde medidas em meio aberto ao meio fechado. Olegário Gurgel explica que o meio aberto é executado pelo município, através do Centro de Referência Especializado na Assistência Social (CREAS), que executa a Liberdade Assistida (LA) e a Prestação de Serviço à Comunidade (PSC). Ao Estado, cabe executar as medidas socioeducativas em que há privação de liberdade. Nesse sentido, os três programas existentes em Mossoró são: Centro de Internação para Adolescentes Infratores (CIAD), que é que executa a medida de internação provisória, ou seja, o adolescente que cometeu um ato infracional grave fica privado de liberdade até haver o julgamento. Já os Centros Educacionais (CEDUCs) funcionam em dois sentidos. O Ceduc Internação, que é o centro para execução da medida de privação de liberdade mais gravosa fechada, e o Ceduc Semiliberdade, conhecido como Ceduc Santa Delmira.

“Então, nós temos todos os planos de socioeducação. Obviamente, com seus méritos e os deméritos, ou seja, todas essas entidades do meio aberto municipal e do meio fechado estadual têm as suas conquistas, mas também têm as suas deficiências. E hoje, a grande deficiência se a gente for ver a perspectiva do Sinase, em Mossoró, é a falta de recursos humanos e estrutura física inadequada”, afirma o promotor.

O coordenador regional do Sinai, Hermes Oliveira, diz que é favorável à questão de repensar a maioridade, porém lamenta a situação dos Ceducs e frisa ainda que o sistema é muito falho. Além das questões estruturais, ele afirma que os adolescentes têm acesso a informações por meio da televisão e do rádio, tomando conhecimento sobre o que ocorre e para onde estão sendo direcionados outros infratores.

Hermes menciona que, na prática, o que está previsto no ECA não acontece, e revela que o governo não oferece a guarda e nem as condições de seguranças necessárias no interior dos Ceducs.

Ele acredita que o problema começa pela questão da falta de prioridade do governo em ressocializar os menores. A figura dos agentes de segurança, que são as pessoas desarmadas, mas preparadas para garantir a segurança dos educadores, segundo Hermes Oliveira, também não existe.

Sem segurança, os profissionais sentem medo de dar aula. Além disso, ele afirma que os cadeados são quebrados com frequência e que não há divisão de periculosidade entre os internos. A estrutura, segundo ele, facilita as fugas.

Hermes Oliveira argumenta ainda que as indicações políticas levam à nomeação de pessoas que não sabem o papel da instituição.

De acordo com Olegário Gurgel, o Ministério Público tem ações civis públicas executando o Governo do Estado para que providencie melhorias, não só em recursos humanos como também estrutura física. Em função da intervenção do órgão, duas das entidades estão, parcialmente, interditadas. “O Ceduc Internação atende com 60% de sua capacidade e o Ciad só consegue atender a 50% de sua capacidade, porque foram interditados por liminares em ações civis públicas oferecidas pelo Ministério Público e só trabalham nisso porque só tem condições de trabalhar até aí. Porque falta, efetivamente, pessoal para trabalhar e faltam locais apropriados para a execução dessas medidas socioeducativas”.

Para exemplificar as deficiências no sistema, Liana Aragão informa que, se um adolescente é apreendido em um ato infracional cometido com violência grave ou ameaça e o promotor determine sua permanência no CIAD até o julgamento, a medida só é cumprida se houver vaga no centro. Caso contrário, o adolescente é entregue aos pais.

Atualmente, o Ciad disponibiliza apenas dez vagas e não atende somente adolescentes de Mossoró.



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Fonte: Jornal Gazeta do Oeste



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